Um dia de saudade | Por José Geraldo Schettini
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Um dia de saudade | Por José Geraldo Schettini

Um dia de saudade | Por José Geraldo Schettini
José Geraldo Rodrigues Schettini*

Hoje é um dia de saudade de um fato muito triste, cuja memória me acompanha todos os anos neste final de Outubro, mesmo já passados 55 anos. Para melhor me fazer entender, vou contextualizar o fato dentro de sua época e das necessidades e esperanças de então.

Em 1966, eu e meus colegas do interior que tínhamos concluído o curso secundário no final de ’66, saímos de Leopoldina MG e fomos para as cidades que dispunham de escolas de curso superior, tais como Rio, BH, Juiz de Fora, Viçosa, Ouro Preto…

Pois bem, a maioria, como eu, ia para o Rio. Lá tínhamos um bendito suporte de alimentação do RCE – Restaurante Central dos Estudantes, o não menos famoso CALABOUÇO. Ficava nas imediações do Aeroporto Santos Dumont, onde hoje existe o Viaduto dos Estudantes. Era administrado pela UMES, (União Metropolitana de Estudantes Secundaristas) com apoio do MEC. Era de uso exclusivo de estudante secundaristas ali cadastrados. O cadastro era extremamente simples e acessível. Fornecia uma carteirinha de identificação para utilização do restaurante, que deve ter tido dias de glória, mas em 1966, a comida era péssima, não havia talheres suficientes, a estrutura do prédio era suportada por andaimes para não ruir sobre os usuários, havia goteiras e a comida – o bandejão, embora quase de graça, era de péssima qualidade, nada parecido com os restaurantes universitários das instituições federais de ensino superior da época. Mas era uma ajuda extremamente importante para quem chegava do interior e tinha de pagar para morar, pagar mensalidades caríssimas dos cursinhos preparatório para o vestibular, taxas de inscrição para prestar o exame nas universidades, além, das passagens do transporte público….

Tempos difíceis, mas de extrema esperança e expectativa que nos faziam ignorar solenemente todas estas dificuldades transitórias. Passar no vestibular naquela época, significava se preparar para o sucesso. Praticamente não havia desemprego entre os graduados em cursos superiores.

Pois bem, voltemos ao principal desta narrativa. Ali também era o ponto de encontro dos colegas do interior que frequentavam outros cursinhos, uns que trabalhavam de dia para se sustentar e que frequentavam os cursinhos à noite. Outros só estudavam. Haviam muitos que estavam nesta luta há anos, e outros desistindo, se empregando em atividades que só demandavam o curso secundário, ou pensando em voltar para casa.

Trocávamos ideias durante as refeições, nas mesas do restaurante, e depois no trajeto até os pontos de ônibus. Pois bem, neste dia, no final de Outubro de 1966, ao sair do restaurante, me dirigindo para a Av. Presidente Antônio Carlos, onde pegava o ônibus para meu trabalho diário num banco no Leme, me encontrei com um colega que também ia para seu trabalho diurno no centro da idade. Seu nome era Jose Silvestre. Fazia o cursinho para o vestibular de Arquitetura. Zezinho, como era conhecido entre os colegas, não nasceu em Leopoldina, mas lá fez o secundário, e muitas amizades, dentre as quais o saudoso Nélio Geraldo Reis e o Alfredo Berno Almeida. Pessoa de finíssimo trato, Zezinho também tinha sido colega de minha esposa no primário, quando estudaram juntos na mesma sala num grupo escolar num distrito de Santo Antônio de Pádua.

Assim, depois de encontrar o Zezinho, ainda em frente a Maison de France, na esquina da Presidente Antônio Carlos, conversamos pela última vez. Ele compartilhava comigo as dificuldades que tínhamos para vencer por ter de estudar e trabalhar simultaneamente numa ocasião em que o cursinho muito exigia. Dizia ele então que se sentia extremamente satisfeito com o ritmo de seus estudos no cursinho, onde matérias como desenho e geometria descritiva reforçavam e confirmavam seu interesse pela futura carreia, na área de arquitetura.

O feriado de finados era logo a seguir a este nosso encontro. Zezinho me disse que precisava aproveitar o feriado para ir até sua casa em Recreio, para rever seus pais, dar uma descansada e retornar logo em seguida.

Pois bem, ele viajou para Leopoldina onde residia sua irmã, casada com um rapaz, que me falta o nome, mas que antes deste seu segundo casamento, era viúvo da Cecilia, filha de um gerente do Banco Minero da Produção. A irmã de Zezinho se chama Maria Lúcia, professora na cidade. O seu cunhado, que tinha um Jipe, então decidiu levar o Zezinho até Recreio, (que naquela época não tinha linha de ônibus Rio – Recreio).

Partiu cedo de Leopoldina pela BR 116, e em frente a Fazenda das Laranjeiras, ele estava atrás de um lento caminhão, que começava a fazer um leve curva à direita na pista da BR. Pelo que se determinou depois, parece que o cunhado do Zezinho, que dirigia o jipe, deve ter olhado pela direita do caminhão, e visto a estrada livre na frente deste veículo logo após esta leve curva.

Mas como os construtores da estrada tinham deixado para trás, por meses, uma pendência de obra no acostamento do tal lado direito do caminhão, ou seja um pedaço de aterro muito alto, que suportava provisoriamente um pequeno poste, verificou-se depois que este aterro criava um ponto cego em relação a uns poucos metros da pista da BR 116, logo após a citada curva.

Avaliando que estava livre a estrada na frente do caminhão, o jipe iniciou a ultrapassagem, mas imediatamente se defrontou com um ônibus e se chocaram de frente. Todos do jipe faleceram no local.
Zezinho devia ter uns 22 anos. O acidente nos chocou tanto, tanto, que todos os anos nesta data sempre, me lembro de nosso último encontro naquela esquina no Rio, quando ele transbordava esperança e vivia um sonho, por isto hoje, já passados 55 anos, ainda triste, me permito escrever estas linhas em lembrança e homenagem ao colega José Silvestre Que Deus o tenha em sua Gloria.

*José Geraldo Rodrigues Schettini nasceu em Leopoldina, na Rua Barão de Cotegipe, 152, no dia 12 de outubro de 1944. Filho de Bras Schettini e Maria Geralda R. Schettini. Estudou no Ginásio Leopoldinense. Graduado em Engenharia Química na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Pós Graduado em Engenharia de Segurança do Trabalho pela Universidade Federal Fluminense (UFF) / Associação de Engenheiros e Arquitetos de Volta Redonda (AEVR) / Fundação Jorge Duprat Figueiredo (Fundacentro), foi Gerente de Setor na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e Superintendente de Planejamento e Controle na área de Engenharia da Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), hoje ArcelorMittal, em Vitória, Espírito Santo, onde reside. Atualmente é Consultor na área de Engenharia.

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